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A alimentação é um direito humano, mas falta ação

A alimentação é um direito humano, mas falta ação
10 de Dezembro de 2018

Dados recentes revelam que 10% dos portugueses tiveram dificuldade em fornecer alimentos suficientes a toda a família e cerca de 3% das famílias viveram ‘insegurança alimentar moderada ou grave’.



Há precisamente 70 anos a Organização das Nações Unidas deu maior expressão aos direitos da humanidade, no seu sentido político, através da criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos.


Todos reconhecemos a importância desta declaração nos desafios que se colocam na atualidade, mas nem todos sabemos que, no seu artigo 25º, está consagrado o direito humano a uma alimentação adequada.


Este é um direito óbvio e essencial, pois sem alimentos para provir os necessários nutrientes, o ser humano não pode ter uma vida plena. O que implica que todos devemos ter acesso regular a uma alimentação suficiente, adequada no plano nutricional e culturalmente aceitável, para uma vida sã e ativa.


Mas será que, tantos anos volvidos, Portugal considera a alimentação como um direito humano?


Recordemos que só em 1978, com a consolidação do Estado de Direito Democrático, Portugal se comprometeu a garantir os direitos humanos e, por esta via, o direito à alimentação está considerado.


Apesar deste direito estar inerente a outros, como o direito à vida e o direito à saúde, não é reconhecido de forma explícita na nossa Constituição, nem nos princípios orientadores das políticas do Estado.


No entanto, nestes 40 anos, não podemos negar que há trabalho feito nesta matéria, desde as refeições escolares subsidiadas, o leite escolar, o regime da fruta escolar, a criação da roda dos alimentos e até a aposta numa nova profissão de saúde, os nutricionistas.


Mas, em matéria da concretização do direito à alimentação adequada, Portugal tem ainda um longo caminho a percorrer.


Dados recentes revelam que 10% dos portugueses tiveram dificuldade em fornecer alimentos suficientes a toda a família e cerca de 3% das famílias viveram ‘insegurança alimentar moderada ou grave’, ou seja, alteraram os seus hábitos alimentares e reduziram o consumo de alimentos. Por outro lado, mais de metade da população portuguesa tem excesso de peso.


Coexistem, portanto, situações de alimentação insuficiente e alimentação excessiva, o que se repercute em sérios problemas na saúde dos portugueses. A persistência de tal quadro é de grande preocupação e deve ser motivo de mobilização. O Estado tem o dever, por isso, de garantir o direito humano a uma alimentação adequada traçando políticas que o assegurem.


Nos últimos anos, Portugal criou uma série de normativos em consonância com os tratados e convenções internacionais para garantir o direito à alimentação e consolidá-los nas políticas públicas. É disso expressão a publicação, no ano transato, da Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável e o recém-criado Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Mas importa passar do papel à ação.


Estamos a viver mais anos, mas com menos saúde devido ao facto de comermos inadequadamente.


Queremos dar mais anos à nossa vida, mas também mais vida aos nossos anos. Para tal temos o dever coletivo de trabalhar na consagração do direito humano à alimentação adequada.


É preciso haver uma postura firme para permitir que pequenas ações cotidianas, como realizar refeições ao longo do dia, comprar fruta ou legumes seja fácil, barato e acessível a todos.


É preciso possibilitar o acesso a um ambiente alimentar salutogénico para todos os portugueses.


O facto de ainda existirem portugueses que não têm acesso a alimentos ou que se alimentam de forma desajustado significa que temos um sistema alimentar que não funciona. E isto é, claramente, um insucesso coletivo.



Alexandra Bento

Bastonária da Ordem dos Nutricionistas



Fonte: Observador, online, 10 de dezembro de 2018