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Intervalo para almoço: estamos demasiado ocupados para comer bem... e isso paga-se

Intervalo para almoço: estamos demasiado ocupados para comer bem... e isso paga-se
25 de Maio de 2019

O pão comprado já fatiado, as sopas pré-cozinhadas ou a comida congelada para preparar no micro-ondas foram apenas o princípio. Nos últimos anos, somaram-se nos hipermercados soluções que prometem fazer poupar o máximo de tempo na preparação das refeições. O tempo tornou-se também ele um elemento de marketing para a indústria alimentar. É o resultado de uma transformação que começou no mercado de trabalho e se estendeu às prateleiras do supermercado. Quinze minutos de pausa para consumir uma boa refeição parecem-nos puro desperdício de tempo, mas meia hora a navegar na internet e a fazer compras online sabe a pouco. Os profissionais dizem-se demasiado ocupados para comer bem, sacrificam as horas de almoço, e pagam os custos da falta de tempo com a saúde (física e mental) e com a falta de produtividade. Mas desta, quem paga a fatura são as empresas.


Faltam dados recentes que ilustrem o problema, mas os nutricionistas identificam-no bem. A última vez que o Eurostat estudou o comportamento alimentar dos europeus face às refeições foi em 2010. Nessa altura, era fácil encontrar diferenças entre as rotinas alimentares dos vários países do velho continente. Alemanha, Reino Unido, Finlândia, Noruega, Polónia e Estónia destacavam-se pela ausência de um padrão horário rígido para as refeições. Os dados mostram que nestes países é difícil encontrar um momento do dia em que mais de 20% da população esteja a comer em simultâneo (ver infografia). Já em países como França, Itália, Espanha e Bélgica, as refeições ocorrem em horários muito semelhantes. Se o Eurostat tivesse dados para Portugal nesse ano, e não tem, o país estaria neste grupo. Mas o cenário atual já seria outro.



"É PRECISO DAR CALMA E DIGNIDADE À REFEIÇÃO"


No ano passado, quando a UberEats celebrou um ano de atividade em Portugal, a empresa de análise de mercado YouGov divulgou um estudo sobre as práticas alimentares dos profissionais em Portugal, onde concluiu que embora o país tenha a hora de almoço mais longa da Europa (em média 58 minutos), 17% dos profissionais portugueses não abandonam o posto de trabalho para almoçar e comem, solitariamente, na sua secretária. Três por cento admitem mesmo que não têm tempo para fazer uma pausa de almoço e 22% comem e trabalham em simultâneo, para conseguirem assegurar todas as tarefas que têm a seu cargo. Um retrato que não espanta a bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento. “O tempo que legalmente temos regulamentado para a refeição não é um imperativo de qualidade. Não é por termos mais tempo que comemos melhor ou que fazemos as necessárias pausas para descanso”, realça argumentando que os hábitos dos profissionais têm piorado genericamente nesta matéria.


As rotinas laborais “mataram” as longas pausas para almoço, muitas vezes entre colegas, que durante várias gerações eram prática nas empresas. E este não é um problema exclusivo dos portugueses. Come-se hoje à secretária ou até de pé, no mínimo tempo possível para não atrapalhar as tarefas profissionais, e nem sempre a escolha alimentar é a mais adequada. Mas para a especialista em nutrição Amanda Hamilton, que colaborou no estudo da YouGov, esta não é apenas uma questão de comer bem ou mal. “O declínio da tradicional hora de almoço significa que os profissionais não estão a ter a possibilidade de restabelecer energias e refrescar a sua cabeça”, explica defendendo que “é essencial que as pessoas façam boas escolhas no horário de almoço para garantir que se sentem melhor durante o horário de trabalho”.


E se “fazer boas escolhas é importante”, saber parar é fundamental. “É preciso dar calma e dignidade ao momento da refeição”, defende a bastonária Alexandra Bento. A representante dos nutricionistas diz que do ponto de vista das escolhas nutricionais, “há segmentos muito diferentes entre os profissionais portugueses”. É que a mesma geração jovem que impulsionou um estilo de vida mais acelerado e que foi aniquilando aos poucos a prática da hora de almoço, é também aquela que tende a ter maior cuidado nas suas escolhas alimentares e que recuperou “o culto da marmita”. “É interessante perceber que a marmita, o ato de levar comida de casa, que durante anos foi visto como um sinal de pobreza é hoje um estatuto. Há cada vez mais profissionais de topo, qualificados, informados e preocupados com a sua saúde que sabem que têm de comer em menos tempo, mas não estão dispostos a comer mal”, explica.


Ainda assim, defende a bastonária, a questão do tempo dedicado à pausa para refeição é determinante para os resultados dos profissionais na empresa. “Há uma relação direta entre as práticas alimentares, os tempos de pausa ao longo do dia, o absentismo dos profissionais e a sua produtividade”, realça. E há diversos estudos a demonstrá-lo. O mais recente, da consultora americana Gallup, revela que a hora de almoço tem um impacto profundo na produtividade, no grau compromisso dos profissionais para com a empresa e na criação de ambientes de trabalho estimulantes e produtivos (ver caixa ao lado).Trabalhar ininterruptamente, sem pausas ao longo do dia, não só é contraproducente como “é um caminho aberto para problemas de saúde e absentismo, com custos elevados para as empresas”, enfatiza Alexandra Bento.


HÁBITOS ALIMENTARES DOS EUROPEUS AO LONGO DO DIA

% de participação, 2010





Fonte: Expresso, edição online, 25 de maio de 2019