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Entrevista a Alexandra Bento: A mudança não se deve cingir às cantinas, mas a todo o ambiente universitário

Entrevista a Alexandra Bento: A mudança não se deve cingir às cantinas, mas a todo o ambiente universitário
27 de Setembro de 2019

A bastonária da Ordem dos Nutricionistas adverte, em entrevista ao Expresso, que “as alterações nas ementas devem ser asseguradas por um nutricionista”, face à decisão da Universidade de Coimbra de chumbar a carne de vaca nas suas cantinas. Alexandra Bento defende uma mudança mais alargada e propõe a retirada das máquinas de venda automática.



Vivemos um tempo de emergência climática e temos de colocar um travão nesta catástrofe ambiental anunciada.” Foram estas as palavras escolhidas por Amílcar Falcão, reitor da Universidade de Coimbra, para justificar a decisão de, a partir de janeiro, banir o consumo de carne de vaca das cantinas académicas. Estavam reunidos os ingredientes q.b. para uma dose de polémica, com reações bem ou mal passadas.


A discussão tem-se centrado muito no impacto ambiental, sempre com a emissão de CO2 como prato do dia no menu do argumentário. Mas que peso pode ter na balança nutritiva esta alteração na dieta? A explicação é dada por Alexandra Bento, bastonária da Ordem dos Nutricionistas.


Como reage à decisão da UC de eliminar a carne de vaca das cantinas? A medida é alicerçada pelo impacto ambiental, mas do ponto de vista nutritivo é aconselhável?

A presença de carne de vaca nas ementas da Universidade de Coimbra já não era muito frequente. A Ordem dos Nutricionistas alerta para que todas as alterações efetuadas nas ementas devem ser asseguradas por um nutricionista. A carne de vaca é um alimento de grande riqueza nutricional, mas os portugueses consomem quantidades significativamente superiores aos valores recomendados, mais 12% face ao preconizado no guia alimentar. Duplicámos, nos últimos 40 anos, a oferta de carne no nosso país. Existe uma clara necessidade de redução do consumo de carne vermelha pelos portugueses.



"Nos últimos anos foram intensificados alguns erros alimentares. Os hábitos inadequados dos

portugueses foram, em 2017, o terceiro fator de risco para a perda de anos de vida saudável"



Outros alimentos também poderiam ser excluídos?

A mudança não se deve cingir às cantinas, mas a todo o ambiente universitário. Há alimentos menos interessantes que deveriam ser retirados, como aqueles disponibilizados nas máquinas de venda automáticas, que são produtos processados, ricos em açúcares, sal e ácidos gordos trans que não devem fazer parte dos nossos hábitos alimentares diários e que podem simultaneamente apresentar uma elevada pegada ecológica.


Que fatores servem de barómetro para medir o impacto ambiental da produção alimentar?

Associa-se a vários fatores, como a utilização do solo e da água, a formação de gases com efeito de estufa, o desperdício alimentar, o recurso a fertilizantes e pesticidas, e ainda os quilómetros percorridos até chegar ao prato, sem esquecer a forma como os alimentos são embalados e armazenados.


Os portugueses têm maus hábitos alimentares?

Nos últimos anos foram intensificados alguns erros alimentares. Destaca-se a diminuída ingestão de fruta, produtos hortícolas e leguminosas. Os hábitos inadequados dos portugueses foram, em 2017, o terceiro fator de risco para a perda de anos de vida saudável, devido a doenças metabólicas, doenças do aparelho circulatório e neoplasias.


A dieta mediterrânica é frequentemente aconselhada. O que a torna tão rica e completa?

É claramente o padrão alimentar que deve ser promovido em Portugal, já que guarda uma relação estreita com a saúde, com a nossa tradição, com a nossa cultura e que tem alimentos próprios da nossa zona geográfica. Existe evidência científica de que é uma forma saudável e sustentável de comer. Diversos estudos têm vindo a sugerir uma relação entre a adesão ao padrão alimentar mediterrânico e um maior grau de proteção contra mortalidade por todas as causas, destacando-se como fator protetor para o desenvolvimento de doenças crónicas.


Que alimentos compõem a dieta mediterrânica e quais são erradamente incluídos?

Caracteriza-se pelo consumo elevado de produtos hortícolas, fruta e frutos oleaginosos, cereais integrais, utilização de azeite como fonte principal de gordura adicionada, consumo moderado de pescado, aves e produtos lácteos, ovos e baixo consumo de carnes vermelhas. Devemos privilegiar os alimentos de origem vegetal e escolher aqueles que são frescos, da época, minimamente processados e de produção de proximidade.



"Não há qualquer necessidade de recorrer a suplementos alimentares, que são compostos

por princípios ativos que podem interagir com os alimentos e com os medicamentos"



Pode uma dieta vegetariana ou vegan oferecer os nutrientes necessários para uma vida saudável?

Quando bem planeada, pode ser equilibrada. Contudo, ao excluir alimentos de origem animal e os seus derivados, pode acarretar riscos para a saúde se não existir o devido cuidado nas escolhas. Pode levar a deficiências nutricionais, nomeadamente de vitamina B12, cálcio, vitamina D, ferro e ácidos gordos ómega 3.


É cada vez mais frequente o recurso a suplementos alimentares. São recomendáveis ou têm riscos associados?

Os alimentos fornecem todos os elementos necessários ao organismo e não há qualquer necessidade de recorrer a suplementos alimentares, que são compostos por princípios ativos que podem interagir com os alimentos e com os medicamentos.



Fonte: Expresso, online, 27 de setembro de 2019