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'O empregador deve promover uma avaliação adequada da saúde nutricional dos trabalhadores', alerta Bastonária

'O empregador deve promover uma avaliação adequada da saúde nutricional dos trabalhadores', alerta Bastonária
21 de Maio de 2021

No âmbito do projeto Ecossistemas dos Ambientes de Trabalho Saudáveis (EATS) para avaliar as condições de saúde e estilos de vida dos profissionais e de que forma as organizações são ecossistemas promotores da saúde e bem-estar, o contributo da Ordem dos Nutricionistas é o segundo caso divulgado na nova rubrica da Líder: Healthy Workplaces.


Todas as semanas, uma organização, das mais de 40 que integram o projeto, partilha reflexões e práticas de ambientes de trabalho saudáveis em diferentes setores e atividades.


Os hábitos alimentares e o estilo de vida são fundamentais para a saúde e bem-estar dos profissionais. Os ambientes de trabalho podem promover uma alimentação e um estilo de vida mais saudável junto dos seus profissionais e de outros stakeholders. Esta semana contamos com a partilha e experiência da Bastonária da Ordem dos Nutricionistas Alexandra Bento acerca da forma como as organizações na relação com os profissionais e contexto envolvente podem ser um fator promotor de saúde.


“Os locais de trabalho representam uma grande influência na qualidade de vida dos trabalhadores. Sendo o trabalhador uma peça chave no processo de produtividade das instituições, a promoção da harmonia entre o ambiente de trabalho e a sua saúde física e mental revela-se de grande importância.


Os princípios da promoção da saúde, segundo a Carta de Ottawa, remetem-nos para a saúde enquanto bem público e fundamental para o desenvolvimento social e económico, e reforça ainda que a saúde é criada e vivenciada pelas populações, nos diferentes contextos do seu quotidiano, nomeadamente, nos locais de trabalho[1]. O conceito de ambiente de trabalho saudável, proposto pela Organização Mundial da Saúde, em 2010 reporta uma visão holística, em que os trabalhadores e os empregadores colaboram conjuntamente com vista à proteção e promoção da saúde e bem-estar e de garantia da sua segurança, em prol da sustentabilidade do trabalho[2].

 

Esta abordagem demonstra uma evolução da visão “clássica” do ambiente de trabalho, focada exclusivamente no ambiente físico. A segurança e saúde no trabalho tem vindo a ter grandes desenvolvimentos, devendo o ambiente laboral evoluir para um espaço simultaneamente protetor e promotor da saúde dos trabalhadores, ajustado às necessidades de todos e sustentável ao longo do tempo[2].


Sabemos que em Portugal os hábitos alimentares inadequados estão entre os cinco fatores de risco que mais contribuem para a perda de anos de vida saudável e para a mortalidade, concorrendo para 7,3% destes anos de vida saudáveis perdidos e para 11,4% da mortalidade. Quando somamos ao peso dos hábitos alimentares inadequados, os fatores de risco metabólicos associados à alimentação desadequada, designadamente o índice de massa corporal elevado, a glicose plasmática aumentada, a hipertensão arterial e o colesterol LDL elevado é possível constatar que estes fatores de risco representam, em conjunto, cerca de 38% da carga total da doença, expressa em anos de vida saudáveis perdidos e que cerca de 60% das mortes anuais se encontram associadas a estes fatores de risco[3],[4].

 

No nosso país é elevada a prevalência de doenças crónicas associadas à alimentação desadequada, sendo muito provavelmente um dos principais problemas de saúde pública da atualidade. Na população adulta, os dados disponíveis revelam-nos que a prevalência da diabetes tipo 2 é de aproximadamente 10%, a prevalência de hipertensão arterial é de 36% e a de obesidade de 29%[5].

 

Por outro lado, fruto do uso massivo das tecnologias de informação e comunicação e da recente adoção do regime de teletrabalho, devido à COVID-19, estes problemas de saúde podem ser adensados, uma vez que este contexto pode levar à adoção de comportamentos mais sedentários. A evidência científica revela-nos que os indivíduos com peso em excesso apresentam um maior risco de perda de produtividade de trabalho e de absentismo[6],[7].

 

Enquanto os riscos para a saúde física associados a más condições de trabalho estão cada vez melhor controlados e geridos, os problemas de saúde nutricional não têm sido devidamente abordados.


De facto, a alimentação no local de trabalho constitui uma área pouco desenvolvida e as instituições estão pouco sensibilizadas para a sua importância, pelo que a implementação de programas de promoção de hábitos alimentares saudáveis nos locais de trabalho, constitui uma medida urgente e necessária, no qual o nutricionista deverá ter uma voz ativa.


Desta feita, deve a saúde ocupacional evoluir para um modelo de prática profissional colaborativa que clarifique, valorize e reconheça as competências de outras áreas do saber em matéria de saúde no trabalho[8]. O nutricionista assume-se como um dos profissionais de saúde preparados para auxiliar as instituições empregadoras para o estudo e avaliação de estratégias específicas que promovam o desenvolvimento e implementação de ambientes de trabalho saudáveis. A sua intervenção poderá ocorrer simultaneamente nos seguintes níveis:

 

 

Saúde nutricional dos trabalhadores

O empregador deve promover uma avaliação adequada da saúde nutricional dos trabalhadores, nomeadamente através da avaliação dos recursos para a saúde individual no ambiente de trabalho, contando com a colaboração do nutricionista. Concomitantemente a esta vigilância regular do estado nutricional, deve ser ainda trabalhada a capacitação dos trabalhadores para escolhas alimentares mais saudáveis, através do desenvolvimento de programas no domínio da educação alimentar e nutricional, dirigidos aos trabalhadores no seu contexto laboral.

 

Ambiente alimentar salutogénico

Os trabalhadores passam aproximadamente 1/3 do seu dia no local de trabalho e, nalguns casos, aí realizam algumas das suas refeições. Num local de trabalho promotor da saúde deverá haver uma oferta alimentar saudável. Neste sentido, o ambiente alimentar laboral, onde se inclui a oferta alimentar disponibilizada aos trabalhadores, como seja em refeitórios, bares, cafetarias ou máquinas de venda automáticas, evidenciam-se como vetores fundamentais de atuação e intervenção do nutricionista.

A Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho destaca a importância do fornecimento de alimentos e refeições saudáveis nos espaços de alimentação do local de trabalho, para incentivar a aquisição de estilos de vida saudável, no sentido de promoção de saúde[9].

 

Perante o retrato da saúde nutricional no nosso país revela-se determinante uma atualização dos normativos em matéria de segurança e saúde no trabalho [10]. A melhoria das normas de saúde e segurança no trabalho não só é essencial para proteger e promover a segurança e a saúde dos trabalhadores, como também se revela benéfica para a produtividade do trabalho e da economia em geral. A integração do nutricionista nas instituições, enquanto elemento da equipa de profissionais de segurança e saúde no trabalho, poderá aportar valor no contexto da construção de ambientes de trabalho saudáveis, intervindo a nível individual, mas também no ambiente em si, adaptando a sua intervenção à realidade e necessidade locais. Os seus conhecimentos e competências serão uma mais-valia para assegurar elevados níveis de saúde e de produtividade, menores taxas de absentismo e bem-estar no local de trabalho, promovendo assim ambientes laborais saudáveis.

 

A promoção de ambientes de trabalho saudáveis, com o envolvimento de nutricionistas, deve ser incentivada devido à sua eficácia na adoção dos hábitos alimentares e estilos de vida saudáveis, por parte dos trabalhadores, que os transpõem para a vida familiar e social.”



Por 
Alexandra Bento, Bastonária da Ordem dos Nutricionistas

 

 

[1] Carta de Ottawa. In: 1ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde. Ottawa, Canadá; 1986. Disponível em https://www.dgs.pt/documentos-e-publicacoes/carta-de-otawa-pdf1.aspx

[2] WHO (2010) Healthy workplaces: a model for action: for employers, workers, policymakers and practitioners

[3] Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME). Global Burden Disease Portugal 2019. Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME); 2020

[4] Gregório MJ, Sousa SM, Teixeira D, Ferreira B, Figueira I, Taipa M, et al. Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável 2020. Lisboa: Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, Direção-Geral da Saúde; 2020

[5] Barreto M, Gaio V, Kislaya I, Antunes L, Rodrigues AP, Silva AC, et al. 1º Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF 2015): Estado de Saúde. Lisboa: INSA IP; 2016.

[6] Goettler A, Grosse A, Sonntag D. Productivity loss due to overweight and obesity: a systematic review of indirect costs. BMJ Open 2017;7:e014632. doi:10.1136/ bmjopen-2016-014632

[7] Shrestha N, Pedisic Z, Neil-Sztramko S, Kukkonen-Harjula KT, Hermans V. The Impact of Obesity in the Workplace: a Review of Contributing Factors, Consequences and Potential Solutions. Curr Obes Rep. 2016 Sep;5(3):344-60

[8] Direção-Geral da Saúde (2018) PROGRAMA NACIONAL DE SAÚDE OCUPACIONAL (PNSOC) – Extensão 2018/2020. Lisboa: Direção-Geral da Saúde, 2018. Disponível em https://www.dgs.pt/saude-ocupacional/documentos-so/pnsoc_extensao-pdf.aspx

[9]   Facts: Promoção da saúde no local de trabalho para empregadores (aceder em: https://osha.europa.eu/pt/publications/factsheet-94-workplace-health-promotion-employees)

[10] Comissão Europeia (2021) COM/2021/102 final. Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:b7c08d86-7cd5-11eb-9ac9-01aa75ed71a1.0023.02/DOC_1&format=PDF




Fonte: Líder Magazine, Sapo, online, 20 de maio de 2021